Press ESC to close

#cutetalk com Duília de Mello, a astrônoma brasileira que arrasa na NASA

duilia-destaque

No dia em que o telescópio espacial Hubble completa 25 anos, entrevistamos a astrônoma e escritora brasileira radicada nos EUA.

Formada em Astronomia pela UFRJ e com passagem pelo Cerro Tololo Inter-American Observatory, no Chile, Duília de Mello atualmente é pesquisadora associada da NASA, trabalhando no Goddard Space Flight Center, em Washington, EUA. Em 2013, a pesquisadora foi escolhida como uma das ”10 mulheres que mudam o Brasil” pelo Barnard College/Columbia University e em 2014  foi escolhida pela Revista ”Época” como uma das ”100 pessoas mais influentes do Brasil”. Coisa pouca, né?

duilia3

Nessa entrevista, a pesquisadora, professora  e escritora fala sobre a presença de mulheres na ciência, como é trabalhar na NASA, sobre a ”onda nerd” que vem tomando conta do mundo e muito mais.
Confira:

O que acontece quando uma pessoa que você não conhece pergunta o que você faz e você responde ‘’sou astrônoma’’? Já passou alguma situação engraçada/bizarra por causa disso?

“Se me pedirem para fazer o horóscopo, sou capaz de deixar a pessoa falando sozinha ou dizer que o futuro dela está contado…”

Quando falo que sou astrônoma geralmente as pessoas acham interessante, mas muitos confundem com astrologia e aí eu fico uma fera (risos). Se me pedirem para fazer o horóscopo, sou capaz de deixar a pessoa falando sozinha ou dizer que o futuro dela está contado… Acho que a situação mais interessante ocorreu quando recebi o prêmio Diáspora Brasil e fui apresentada como “Astrofísica Extragaláctica”. Nunca tinha percebido que as pessoas arregalavam os olhos quando me apresentavam assim.

satronologia-astronomia

 Quando você era estudante da UFRJ, qual o futuro que imaginava para si? Sempre quis trabalhar na NASA?

A carreira de astronomia é acadêmica e é necessário fazer mestrado e doutorado antes de conseguir trabalho. Eu já sabia disto quando estava cursando, então estava procurando o local para fazer a pós-graduação. Não imaginava trabalhar na NASA, gostaria de ser professora e pesquisadora universitária, como todos são.

nasafoto

O que você sentiu ao entrar na NASA pela primeira vez? Foi emocionante?

A NASA tem um ambiente de trabalho muito inspirador! Eu comecei como pós-doutoranda no instituto de Ciências do telescópio espacial – que também é da NASA – e quando cheguei lá pela primeira vez, tive que me beliscar para ver se era mesmo verdade. Alguns anos depois eu fui para o centro da NASA, o Goddard Space Flight Center, mas eu já estava acostumada com este ambiente, então não foi tão chocante… Mas olha, aqui nos EUA falar em NASA também impressiona a todos! Como eu sou professora universitária, além de pesquisadora, eu sempre vejo os estudantes americanos arregalando os olhos quando falo que faço pesquisa lá.

Imagem da celebração oficial dos 25 anos do telescópio Hubble (NASA)
Imagem da celebração oficial dos 25 anos do telescópio Hubble (NASA)

A nossa opinião aqui no Brasil  sobre a NASA é muito influenciada pelos filmes. Você que está lá dentro conta pra gente: Hollywood representa direitinho? O que tem de diferente ou similar?

“…aquela impressão de que é tudo super moderno na NASA, nem sempre é verdade.”

Tem coisas parecidas e coisas diferentes… Aquele espírito de equipe é verdadeiro, mas aquela impressão de que é tudo super moderno na NASA, nem sempre é verdade. A NASA é um orgão do governo e tudo lá é o mais barato possível.

Para os leigos, pode parecer que descobrir uma Supernova ou um orfanato de estrelas (as Bolhas Azuis) é fácil com um equipamento potente.  Conte pra gente como é de verdade este processo e qual a importância de uma descoberta dessas.

“Foi a minha curiosidade que levou a descoberta e não o instrumento em si”.

As descobertas demoram muito tempo para acontecer e as vezes nem nos damos conta que descobrimos algo. No caso da Supernova, foi uma descoberta um pouco diferente pois eu não estava usando um telescópio potente. Na verdade, o telescópio não tinha uma câmera para fazer imagens e eu estava usando um instrumento que mostra os elementos químicos dos objetos. Porém, quando eu fiz uma comparação do campo estelar que estava observando na telinha do instrumento com um mapa do céu, eu verifiquei a presença de um objeto que não estava no mapa! Decidi que deveria passar a o instrumento neste objeto intruso.

No dia seguinte, utilizamos um outro telescópio para confirmar que este objeto era uma supernova, ou seja, uma estrela que havia explodido e por isto estava brilhante. Foi a minha curiosidade que levou a descoberta e não o instrumento em si. Já as bolhas azuis foi bem diferente, um processo mais lento e mais parecido com as descobertas que acontecem na astronomia. Tive que fazer uma interpretação das observações para depois classificar como uma descoberta.

Bolhas azuis, imagem crédito da NASA
Bolhas azuis, imagem crédito da NASA

Poderia falar um pouco sobre o trabalho que você está elaborando agora?

 “Comecei também um projeto de Big Data para identificar galáxias…”

Eu estou trabalhando com objetos distantes e tentando entender como a Via Láctea se formou. Estou utilizando imagens profundas ultravioletas obtidas com o Hubble para isto. Comecei também um projeto de Big Data para identificar galáxias que estão em colisão; a colisão de galáxias é muito importante no processo evolutivo das galáxias. Atualmente estou procurando financiamento para este projeto e se conseguir devo contratar estudantes de doutorado para trabalhar comigo nele.

O cientista Neil DeGrasse deu um depoimento sobre mulheres na ciência (assista abaixo). Qual o seu ponto de vista?

Eu conheço o depoimento dele e achei muito interessante a analogia. O sexismo e o preconceito contra a mulher na ciência existe sim – e o Brasil não está entre os piores países, pelo contrário. Porém, não dá para deixar de lado os números. O número de mulheres na astronomia é relativamente alto se compararmos com a Física. Eu espero que seja uma questão de tempo, pois já houve uma melhora, mas fico um pouco ansiosa pois esperava que a esta altura a Física tivesse mais mulheres… infelizmente, as ciências exatas ainda são vistas como coisas de menino e a sociedade precisa batalhar para acabar com esta imagem.

Você acha que o Rio de Janeiro e/ou Brasil tem suporte educacional / profissional pra quem quiser seguir a sua profissão?

O Brasil está cada vez melhor na astronomia… Nos últimos 10 anos houve muito investimento do governo em fornecer bolsas e auxílios de pesquisa, além de contratar muitos professores e pesquisadores. O astrônomo brasileiro tem atualmente boas condições de desenvolver pesquisa no Brasil, porém estaria ainda melhor se o Brasil entrasse para o consórcio europeu de telescópios no Chile. Já estamos tentando o financiamento da adesão há algum tempo, mas o Congresso não aprovou ainda o financiamento da adesão, apesar de ter aprovado o mérito.

Tenho certeza que isto alavancaria a astronomia brasileira… o interessante da astronomia é que ela promove a tecnologia e a inovação, além de inspirar o jovem a seguir carreiras científicas e tecnológicas.

Tirinha de Willtirando
Tirinha de Willtirando

A área de pesquisa fora do Brasil é muito concorrida? Aqui sabemos que os processos para mestrado e doutorado nas faculdades públicas são complicados.  Como é nos EUA? Você teve algum incentivo?

Eu sempre fui bolsista, na iniciação científica, no mestrado e no doutorado, no Brasil. Sempre foi concorrido ganhar bolsas, mas é uma seleção justa; nos EUA também é concorrido. Eu tenho estudantes de doutorado e pago bolsas para eles com os fundos dos meus projetos. Fazemos uma seleção rigorosa dos estudantes e os melhores ganham bolsas.

Duília, a mulher das estrelas
Duília, a mulher das estrelas

Você já escreveu um livro (”Vivendo com as Estrelas”, publicado em 2009) e está trabalhando em outro. Escrever é um passatempo pra você? Como surgiu essa ‘’outra profissão’’ na sua vida?

“Estou publicando agora a estória do Pedro, uma pedra espacial – ele é um meteorito…”

Eu sempre fiz divulgação científica – acho que fazer ciência sem passar adiante é uma perda de tempo enorme. Então tenho bastante contato com o jovem e sei da dificuldade que é para decidir qual carreira seguir, foi por isto que escrevi o meu primeiro livro, onde tento incentivar o jovem a seguir os sonhos e dizer como eu fiz para seguir o meu sonho.

Já o meu segundo livro é para crianças de 6 a 9 anos e estou adorando escrever para crianças! Eu comecei a escrever porque eu lia os livros de crianças que eu comprava para presentear os filhos dos meus amigos e comecei a achar os livros muito chatos, sem mensagem nenhuma e concluí que a criança acabava não aprendendo muita coisa… Resolvi me tornar escritora para melhorar a situação. Estou publicando agora a estória do Pedro, uma pedra espacial – ele é um meteorito que faz parte da minha coleção e ele conta as aventuras dele ao lado dos outros meteoritos na prateleira da minha estante.

duilia-livro
Livro de Duília, de 2009.

Tem algum autor que te influencie a escrever sobre sua profissão?

Eu sou grande fã de Carl Sagan. Ele era um excelente cientista e conseguia escrever ficção como ninguém, além de ser o maior divulgador de ciências de todos os tempos.

Assista a um pensamento de Sagan em forma de vídeo:

Você acha que os americanos são mais ‘’nerds’’ que os brasileiros? Parece que aqui no Brasil essa onda nerd – principalmente após o sucesso da série “The Big Bang Theory’’ – virou moda por aqui…

A moda nerd chegou aqui também. Nunca foi moda ser nerd, pelo contrário, nerd era pejorativo, mas felizmente a coisa está mudando. O que me preocupa é que ainda tem muito bullying com os nerds… Espero que esta moda melhore a situação.

sheldoncooper

Pra terminar: você gosta de ficção científica? Tem algum filme/livro/personagem preferido?

Gosto muito. ‘’Contato’’ é o meu livro-filme preferido. Meu personagem favorito de ficção é o Spock. Eu sempre assisti muita ficção científica, vi todos os ”Star Wars”… Gosto de ”Star Trek” e ”Perdidos no Espaço” também.

Vida longa e próspera pra você também, Duília.
Vida longa e próspera pra você também, Duília.

Veja Duília no ”Fantástico” falando sobre o Hubble e acesse seu site oficial (mulher das estrelas) para mais informações.

 

Clarissa Cavalcante

Tem 24 anos e é formada em Estudos de Mídia pela UFF. Produtora de conteúdo, social media freelancer e apaixonada por cinema, escreve aqui no Cutedrop sobre novidades e inspirações do mundo do Design.

Comments (2)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

@cutedropblog no Instagram